quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Contrato Social

“Don't Ask, Don't Tell: Eu não pergunto, você não me diz. E assim vivemos todos nessa ilusão de realidade. Você fingindo ser o que eu quero e eu fingindo não ver o que você é.”
("E se fosse com você", por Lilah
no Tramas, Tranças e Bobagens)
Ser aceito, incluso, continuar tendo o respeito e carinho da família, dos amigos. Esse é o sonho de todo jovem gay ao se assumir. Mas diante de tantos estereótipos impostos pela mídia o menino e menina homossexual estão adotando aquele que é tido como o mais tolerável. É o que inúmeras vezes ouvi as pessoas chamando de ‘discreto’.


Como é esse tipo? Bem, você é gay e não nega isso, mas também não mostra. Todos sabem que você é gay e não comentam sobre isso. Simples! O que você ganha sendo assim? Ah, sendo discreto você não será excluído dos grupinhos da escola, universidade, trabalho, embora sempre haverá um que vá comentar que você olhou para o moreno bonitão. Em casa, sua mãe vai continuar te apresentando como o filhinho nota 10, mas fará inúmeros planos de passeios com o netinho lindo que você dará a ela quando se casar. Quando você se casar com uma mulher.


As pessoas não te apontarão na rua e dirão ‘lá vai o viadinho’, seus amigos gays não terão vergonha de andar ao seu lado com receio de que eles fiquem com fama de gays (!!!) caso sejam vistos ao lado da bichinha baquiosa. E o melhor, você poderá andar com seu namorado para onde quiser, embora tenham que se comportar como dois amigos do futebol.


O que você perde com isso? Não poderá abraçar, andar de mãos dadas e, sobretudo, beijar seu namorado em locais públicos como cinemas, shoppings, na rua de casa. Você também não poderá apresentar seu namorado como seu namorado para a família e amigos do trabalho. Você também não poderá comentar com a família sobre os seus planos para o futuro que incluem casar com um homem lindo e adotar um bebê.


Ah, mas o mais importante é que você venceu o preconceito e todos vêem com naturalidade a sua homossexualidade, não é mesmo? NÃO! Na verdade, você não venceu o preconceito e nem as pessoas passaram a te respeitar, tanto você quanto elas estão apenas jogando tudo para debaixo do tapete.


Os jovens gays de hoje crescem aprendendo que o gay respeitável é aquele que não demonstra sua sexualidade, que se padroniza em um tipo heterossexualizado. Veja bem, não estou dizendo que ser gay é ser ‘afeminado’, afinal, somos pessoas e como tal, diversificados. É como ser magro, gordo, alto, baixo. Não existe um tipo padrão.


Quando falo em auto-repressão da sexualidade me refiro àquele receio que você tem de trocar um singelo selinho com seu namorado na praça de alimentação do shopping por causa da reação das pessoas. Mais que isso, eu estou falando desse medo que você tem de ser estigmatizado como gay.


Tenho amigos ‘assumidos’ que odeiam o rótulo de gay. Forçam voz, gestos, andar, baseados no modelo de homem heterossexual por que acreditam que assim serão respeitados. Mais que isso, são os primeiros a recriminarem a bichinha baquiosa e a defenderem esse tipo de comportamento utilizando da seguinte expressão: ‘eu não preciso esfregar minha sexualidade na cara das pessoas para ser aceito’.


Mas você, eu, eles, somos gays, independente das nossas posturas. E agindo assim não seremos respeitados, mas invisíveis, ignorados nas nossas necessidades. Por que vivendo nessa ilusão que basta ‘não desmunhecar’ para serem respeitados, mas e mais jovens simplesmente deixam de se importar com a conquista dos seus direitos. Dos nossos direitos de cidadãos que são diariamente cerceados pelas mesmas pessoas que te respeitam por você ser um ‘gay discreto’.


No fim das contas não estamos sendo aceitos, apenas estamos nos acomodando. Não perturbamos as pessoas e em troca elas também não nos importunam. Um contrato social de boa convivência. Só que o preço é elevado. Custa uma vida. A sua vida.

P.S.: Esse texto nasceu de algumas excelentes horas de conversa madrugada afora com a Lilah e o AndreV do Lagrimadecrocodilo's Blog. Aliás, não deixe de lê-los também.

2 comentários:

Lilah disse...

Oi filhote!
Cada vez que eu leio esse texto, gosto mais dele...parceria deliciosa! A acomodação, o ser absorvido pela multidão, fingir que não está ali, deixar de incomodar...são lições que estão tentando fazer os jovens gays engolir a seco. E ainda chamam isso de aceitação....
Amutu!Bj

Jock Dean disse...

Espero que muitas outras parcerias venham. Tenho aprendido muito com você durante esses dias de conversas na madruga. ^^

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