sábado, 4 de setembro de 2010

O lado quente de ser

"Acho que o mundo faz charme e que ele sabe como encantar, por isso sou levada e vou nessa magia de verdade."
(Marina Lima/Antônio Cícero)

Em 1981 Marina já era relativamente conhecida graças ao sucesso da canção “Nosso estranho amor”, composta por Caetano Veloso, que Marina, em dueto com o também cantor, gravou no seu segundo LP, Olhos felizes, de 1980. Apesar disso, Marina não ficou satisfeita com o resultado final do disco.

Além do dueto com Caetano, tiveram boas rotações nas rádios brasileiras as canções “Doce vida” e “Corações a mil”. Essas canções revelaram uma boa cantora, de timbre marcante e segura. No entanto, pelo fato de Marina ser apenas interprete nas três canções – “Doce vida” era de Rita Lee e “Corações a mil” de Gilberto Gil – logo a cantora foi incluída no time de outras tantas boas, mas que apenas gravavam ou regravavam canções de autores consagrados.

Mas não era isso que Marina queria. Ela buscava, não apenas uma identidade que já transparecia em suas canções autorais, mas uma assinatura ímpar na sonoridade de seu trabalho. Foi com esse pensamento que Certos acordes, seu terceiro álbum, foi lançado em 1981.

Para alcançar essa identidade, faltava-lhe apenas amadurecer, corrigir os equívocos de produção e repertório de seus dois primeiros LPs, trocar o departamento das "promessas a vingar" pelo da "vanguarda pronta" e Marina andou a passos largos nesse sentido.

Preferindo as afiadas parcerias com o irmão Antônio Cícero ao aval dos grandes nomes, dispensando as orquestrações complicadas, realizou um disco de eficiente simplicidade, balançado e sugestivo, próprio para as tardes ensolaradas do verão que se aproximava.

Aliás, é impossível falar de Marina sem citar a sua parceria com o irmão Antonio Cícero. Desde o momento que a cantora surgiu, com o álbum Simples como fogo, em 1979, os dois firmaram uma parceria vitoriosa. Cícero entrava com as suas bem sacadas letras, enquanto Marina elaborava as músicas. Assim, sucessos como "A chave do mundo" e "Rastros de luz" viram a luz do dia.

Mas com Certos acordes, podemos dizer que Marina se encontrou. Contando com a produção musical do guitarrista Pisca, a cantora se trancou na casa de seus pais, e fez a pré-produção do álbum. Dessa maneira, a cantora criou o seu estilo próprio, calcado em um "pop carioca" embalado pela sua sensual voz, como pode ser ouvido em canções como "O lado quente do ser" (logo gravada por Maria Bethânia) e "Gata todo dia". Esta última tocou bastante nas rádios, assim como "O charme do mundo", considerado o seu primeiro sucesso autoral.

Canção que abre o disco, "Charme do mundo” traduz esse desejo de Marina em ser identificada pela sua música. Versos como “é um mundo tão novo, que mundo mais louco, até mais que eu, é febre, é amor, e eu quero mais, tudo que eu quero, sério, é todo esse mistério” não poderiam ser mais claros. Em “Quem é esse rapaz” ela vai mais além e inclui, pela primeira vez na música brasileira, a palavra ‘gay’ na letra de uma canção, ao falar sobre mulheres que se apaixonam por homens que não devem.

Marina é mulher e uma mulher cheia de desejos que vive seus sentimentos em sua plenitude, mas sem perder tempo, buscando sempre “O lado quente do ser”. Músicas também nos trazem lembranças, de todo tipo, de pessoas, lugares, situações, afinal “Certos acordes” são nossos e nós os sabemos de cor.

Carioca, praieira, que, aliás, é uma paixão de Marina, assim como o mar e as aventuras vividas em “Maresia”. A voz que canta em "Gata todo dia", parceria sua com Leo Jaime, é, de fato, gata o dia todo, todo dia. A manha e a sanha que arranha o destinatário do conteúdo atravessa a letra e a melodia da canção. Na canção, a voz é uma entidade serpenteando o corpo do ouvinte: na tentativa de explodir as defesas e invadir os desejos do outro. Espalhando erotismo, dengo safado e excitação sacana, as filigranas da "fala" da gata arranham o ouvinte.

Marina é virginiana, mas em “Libra” sua voz rouca seduz nossos ouvidos com a vida de uma libriana em sua essência. Encerrando o disco “Avenida Brasil” mostra que ainda quer percorrer ainda mais sua estrada pela música.

Assim como para Marina, “Charme do mundo” revela meu desejo de viver ainda mais plenamente o que acredito e sentir e expressar o meu lado quente do ser.

Confira algumas das canções desse álbum:

Charme do mundo


Gata todo dia


Acompanhe todos os textos do Especial Marina Lima.

2 comentários:

Francisco Saldanha disse...

Olá.
seu blog é bem bacana.tbm sou fã da Marina e pelo que li no blog temos algo em comum "pierrot" tbm é meu preferido...

abraço.

www.letraslitteratura.blogspot.com

se puder visita o blog.

Jock Dean disse...

Francisco, obrigado pela visita e volte mais vezes, seja para trocar idéias sobre Marina, seja para qualquer papo.

Tenho uma relação muito visceral com "Pierrot". Explicarei quando postar sobre ele.

Adorei seu blog.

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