segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Vivemos em uma democracia?

Essa frase, acerca do que é dito sobre gays, foi dita por um conhecido meu que é mais um dos que não tem preconceito, mas...

 

“O Brasil é democracia. Nós podemos falar o que bem entender.”

 

Já escrevi e recomendei inúmeros textos sobre essa questão, mas não custa lembrar, já que as pessoas se recusam a entender o óbvio.

Não! NINGUÉM pode dizer o que bem entender só porque vivemos em uma democracia. Até por que nossa democracia me parece muito mais “unocrata” que democrata. Toda vez que alguém levanta a voz para ofender ou propagar desinformações sobre gays, são poucos os que se opõem, mas basta um único gay se opor a esse tipo de comportamento que não faltam vozes para sufocá-lo.

Dizem que ele (eu, você, nós, gays) gosta de se vitimizar, que quer tratamento privilegiado “só porque é viado”, que quer submeter os outros ao seu “estilo de vida”, que somos radicais, pois não aceitamos nem “uma piadinha inocente” e uma série de outros argumentos vazios de qualquer fundamentação.

Então, baseados no seu sagrado direito de “falarem o que quiser”, já que estamos em uma democracia e temos o direito à liberdade de expressão, milhares de homofóbicos gastam seu tempo e energia falando “bobagens” sobre gays, sobre ser gay, ajudando a reforçar a idéia de que somos promíscuos, que só vivemos pelo sexo, que somos inferiores, afinal, quando ofendemos alguém é porque queremos preteri-lo e eu NUNCA ouvi ninguém chamar outra pessoa de “viado”, “boiloa”, “bicha” e afins em tom elogioso.

Permitam-me explicar-lhes uma coisa. Não importa se você tem vários amigos gays e não tem nada contra gays, MAS prefere que seu filho não o seja ou não gosta de ver dois homens ou duas mulheres se beijando, pois você é um homofóbico. Não existe meio-preconceito ou preconceito em maior ou menor grau. Preconceito é preconceito, apenas. E se você tem alguma restrição com relação a homossexuais você é SIM preconceituoso e, consequentemente, homofóbico. Seria o mesmo que eu dizer que nada tenho contra negros, mas preferir que eles não dividam o elevador social comigo como já vi diversas vezes nos condomínios da minha moderna São Luís do Maranhão.

Quer alguns exemplos da nossa democracia? Bem, em novembro de 2008, grávida de 7 meses, Claudia Leitte, e seu marido, falaram o seguinte à uma revista de celebridades: “Eu adoro gays, mas prefiro que meu filho seja macho”, afirmou a cantora. “Deus me livre, ele será bem criado”, completou o empresário Márcio Pedreira, marido da cantora.

Oras, se você não tem nada contra gays qual o problema de seu filho ser mais um? E desde quando ser gay é sinônimo de má-criação? Eu fui muitíssimo bem criado. Recebi a melhor educação que meus pais puderam pagar, sempre fui um dos melhores alunos da turma e durante anos fui o modelo de filho que TODAS as amigas da minha mãe desejavam e sou gay. Eu nasci gay e não há nada que pudesse mudar isso.

Se uma mãe dissesse que preferia que seu filho fosse hétero por não querer que ele sofresse tanto preconceito e privação, eu juro que entenderia. Eu sei o que passo. A dor e o sofrimento são quase mortais em dados momentos e que mãe quer que seu filho sofra? Mas a questão é que a maioria delas não quer um filho gay por vergonha, por preconceito.

Mais recentemente Reinaldo Gianechinni, também em uma entrevista, quando perguntado sobre o que pensa acerca dos comentários de que é gay disse: "Se você for ler tudo o que falam de PORCARIA a seu respeito, realmente é deprimente. Em um site de notícias sobre celebridade essa declaração do ator é antecedida pela seguinte frase da jornalista responsável pelo texto na internet: “Mesmo sendo frequentemente visto com mulheres bonitas, o galã ainda é tachado pelas MÁS LÍNGUAS como gay.” Quer dizer que ser gay é uma porcaria e que esse tipo de especulação é algo negativo feito pelas más línguas, isto é, por pessoas desonestas e que querem prejudicar outrem?

Esses são apenas dois exemplos insignificantes perto dos absurdos que políticos falam em seus discursos. Como o deputado federal, Jair Bolsonaro (PP/RJ), que disse ser a favor de palmadas para o filho deixar de ser gay e depois destilou críticas ao Kit de Combate à Homofobia nas escolas: “Atenção, pais de alunos de 7, 8, 9 e 10 anos, da rede pública: no ano que vem, seus filhos vão receber na escola um kit intitulado Combate à Homofobia. Na verdade, é um estímulo ao homossexualismo, à promiscuidade”, afirmou.

Há ainda líderes religiosos como Silas Malafaia, da Assembléia de Deus, que espalhou outdoors homofóbicos no Rio de Janeiro e comparou a homossexualidade, a zoofilia em rede nacional. Ou reverendo Augusto Nicodemus que atacou o projeto de lei que criminaliza a discriminação por orientação sexual, PLC 122, no site da Universidade Presbiteriana Mackenzie. E o que falar do General do exército brasileiro que disse que homossexuais deveriam procurar outro ramo de atividade que não o exército? Fernanda Young terá exibida, na Globo, em 2011, uma série de comédia sobre um ex-gay. Oi?

Enfim, a lista de exemplos de pessoas, programas, piadas, declarações desse tipo seria suficiente para alimentar este blog por anos. Citei apenas alguns para que você, caro leitor, compreenda a dimensão de tudo que é, erroneamente ou propositadamente, dito todos os dias sobre gays. E o que todas essas pessoas tem em comum? O acesso fácil à mídia e o trânsito livre entre a população.

Por que sim, o que dizem é tido como verdade pela maioria dos fãs, partidários, correligionários, eleitores dessas pessoas. Por que é engraçado fazer piadas sobre gays? Por que é democrático alimentar o preconceito e a discriminação? As pessoas não compreendem que essas "pequenas" afirmações incutem conceitos terríveis na cabeça das pessoas. Que os jovens desse pais vão crescer repetindo as mesmas piadas infelizes, as mesmas agressões desumanas que seus ídolos de hoje e que assim NADA vai mudar, que nossa sociedade NUNCA vai evoluir.

A razão dessas linhas, talvez desconexas, é a quantidade de absurdo que tenho ouvido e lido nas últimas semanas pelas quais tentei não me revoltar, mas a gente cansa, não é? Não é simples revolta ou melindre, é a sensação de ser desrespeitado todos os dias da hora em que acordo a hora em que vou dormir, pois mesmo quando não dizem para mim, dizem para outro gay e eu me sinto tocado, afinal, amanhã o gay ofendido pode ser eu.

A verdade é que democracia é um direito que todos defendem, poucos conhecem e quase ninguém pratica.

2 comentários:

Bonter disse...

Interessante, já vi uma mãe dizer ao filho: "Tá falando fino moleque, fala que nem 'homem'"...
Mesmo conhecendo, não recriminei. É o direito dela criar o filho da forma que acha correta (até onde a lei permite), mas me deu uma tristeza no fundo do coração.
Mais que o preconceito, eu acho que é o machismo que precisa ser combatido.
Abraços.

Unknown disse...

Tinha um pai que preferia que seu filho fosse tudo, menos gay. Infelizmente ele já faleceu a 8 anos (eu sempre o amei), pois hj sou bem resolvido comigo mesmo e as duas pessoas mais importantes da minha vida neste exato momento sabem da minha condição sexual, são elas, minha mãe e minha irmã.
Parabéns pelo desabafo
Felicidades

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