quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Edith Modesto: “O ‘politicamente correto’ mascara a homofobia”


Alguns pais não conseguem aceitar a homossexualidade dos filhos, e outros chegam ao extremo da violência física, psicológica e até expulsam os filhos de casa. A reação da professora universitária e doutora em semiótica Edith Modesto foi diferente. Mãe de sete filhos ela fundou, em 1997, o Grupo de Pais de Homossexuais (GPH), cujo objetivo principal é aproximar os pais de seus filhos gays, após descobrir que seu filho mais novo era gay.

Com a intenção de compreender melhor a sexualidade do próprio filho, Edith conseguiu ir além: ajudou e ajuda centenas de pais de homossexuais a aprender a lidar com este tema ainda tão delicado. Em entrevista exclusiva ao Eleições Hoje, Edith fala sobre homofobia, relacionamento entre pais e filhos, e diz que homossexuais precisam ser mais politizados e votar em gays e lésbicas.

Como começou o teu projeto junto aos pais dos homossexuais?
Edith Modesto - O projeto para ajudar pais e jovens LGBTs começou há mais de 20 anos, logo que fiquei sabendo que meu sétimo filho, o caçula, é homossexual. Éramos somente 4 mães.

Vencer os seus próprios preconceitos foi uma das maiores dificuldade?
Edith Modesto - Sem dúvida. Preconceito gruda como chiclete no cabelo e ele é internalizado em todos nós, inclusive nos próprios LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Travestis e Transgêneros).

Como os pais encaram, em geral, a homossexualidade dos filhos?
Edith Modesto - Os pais, no início do processo de aceitação, conforme explico no meu livro “Mãe sempre sabe?” (Editora Record), encaram como uma desgraça que se abateu sobre eles. Ninguém foi preparado para ter filhos homossexuais (LGBTs), pois essa condição ainda não foi naturalizada entre nós.

Existem reações adversas, que chegam a violência física? Tem pais que se negam a participar do projeto mesmo com o pedido dos filhos?
Edith Modesto - Certamente, há pais que se negam a participar do projeto. A maioria, no início do processo, poucos não aceitam nunca. A violência doméstica é enorme no Brasil, por vários motivos. Em pesquisa feita pelo Instituto de Psicologia da USP, em parceria com as pesquisadoras do Laboratório da criança e adolescente (LACRI), aventamos a hipótese de que a violência doméstica contra os LGBTs é a maior atualmente. E a autoviolência é enorme também. Há muitas tentativas de suicídio entre jovens LGBTs, há um número menor de tentativas de suicídio entre as mães, mas também as há.

Você acha que a religião tem uma papel importante na não-aceitação de filhos homossexuais pro parte dos pais? Como você trabalha com isso?
Edith Modesto - A religião tem um papel importantíssimo na vida da maioria dos seres humanos. É uma pena que, em se falando de Deus, as pessoas possam ser homofóbicas! Ser religiosos dificulta muito a aceitação dos pais a filhos LGBTs. Mas, na maioria das vezes, com um trabalho de paciência e solidariedade, o amor aos filhos vence.

Você acredita que a homofobia aumentou no Brasil, ou apenas que há mais visibilidade sobre o assunto?
Edith Modesto - Eu penso que a homossexualidade está sendo naturalizada pouco a pouco no Brasil. Mas essa aceitação acirrou a homofobia de alguns. Por isso a violência contra os LGBTs recrudesceu. São os homofóbicos, desesperados, se Deus quiser, nos estertores da morte.

Você acredita que a condição de vida dos homossexuais progrediu nesta década? Em que aspectos ela ainda deixa a desejar?
Edith Modesto - Eu penso que a condição de vida dos homossexuais melhorou nessa década. Mas ainda falta muito. Principalmente na escola e nos lares. Hoje, já dá pra aceitar que o filho da vizinha é gay, mesmo que as amigas tenham pena dela. Mas, quando a questão entra em casa, é ainda difícil.

Quais são os maiores entraves para a conquista de benefícios por parte dos LGBTs, como casamento civil, lei contra a homofobia, etc?
Edith Modesto - A maior dificuldade atualmente, no meu entender, é a falta de politização dos gays. Os gays e lésbicas precisam votar em homossexuais, para formarem uma bancada que lute por eles! Afirmo isso, mesmo sabendo que não é tão simples esse empoderamento, considerando que os homossexuais, discriminados desde jovens, ficam com a autoestima baixa.

Você é favorável a uma lei que criminalize a homofobia?
Edith Modesto - Há muita necessidade de uma lei que criminalize a homofobia. Precisamos de uma bancada para lutar pelo PLC 122, porque qualquer tipo de discriminação e violência contra as diferenças é crime. Por que a violência contra os negros é crime e contra os LGBTs não é?

O que você acha dos tratamentos para ‘conversão de sexualidade’, existentes em muitas igrejas e consultórios psicologicos? Você acredita que elas causam danos no desenvolvimento da sexualidade dos jovens?
Edith Modesto - O tratamento de reversão já é considerado crime. Psicólogos que fazem isso perdem seus diplomas. Mas o problema é mais complexo. Precisamos de disciplinas nas faculdades, não só de psicologia, sobre “diversidade de orientação sexual e diferenças de gênero”.

Você acha que a escola peca em ensinar para a diversidade sexual? Pesquisas apontam para um alto índice de homofobia nas escolas, como reverter esse quadro?
Edith Modesto - As escolas devem conversar com os jovens sobre a diversidade de orientação sexual, sem dúvida. Mas, novamente, essa ação tão importante, é de grande complexidade. Há que preparar capacitadores para os professores e considerar que qualquer ação na escola não terá resultados positivos se não envolver a comunidade. Assim, teremos de considerar as diferenças socioculturais das comunidades, das escolas, dos professores. Não adianta um kit educativo contra a homofobia, muito bem feito, se ele não for usado, isto é, se os professores não forem preparados e souberem e aceitarem usá-lo.

Acha que uma educação para a diversidade, falando sobre homossexualidade e transsexualidade poderia ‘influenciar’ a sexualidade de jovens que não são gays, como apregoam alguns pastores evangélicos?
Edith Modesto - De jeito nenhum! Eu creio que a diversidade de orientação sexual é uma condição natural e espontânea do ser humano.

O que você tem a dizer a um jovem homossexual que está descobrindo a sua sexualidade e não sabe como agir em relação a ela?
Edith Modesto - Eu teria o cuidado de acompanhar esse processo no ritmo do adolescente, considerando o preconceito já internalizado nele e as pressões familiares, escolares e sociais de modo geral que ele sofre.

E aos pais que descobrem que tem um filho gay, como agir, em linhas gerais?
Edith Modesto - Com os pais, temos de agir também com muita paciência e compreensão. NInguém foi preparado para ter filhos diferentes, na nossa cultura. O positivo, é que o amor, quase sempre, vence!

A aceitação da homossexualidade dos filhos vem com o tempo? Tem pais que nunca aceitam o fato?
Edith Modesto - Sim, a aceitação de um filho LGBT é um processo. Para alguns, mais rápido, para outros, mais lento. Poucos nunca aceitam o fato, muito poucos.

O Brasil é um país homofóbico? A gente já avançou muito em questões como o racismo, mas ele ainda existe e com força. Você acha que a gente mascara nossos preconceitos para que eles pareçam menores?
Edith Modesto - Eu ainda considero o Brasil um país homofóbico, mesmo que essa característica negativa esteja em processo de melhora. Eu penso que, atualmente, há um modismo e que o “politicamente correto” mascara bastante o preconceito e a homofobia que ainda existem, infelizmente. Mas está melhorando.

*William De Luca é repórter de economia do Jornal da Paraíba. Jornalista, ativista LGBT.

**Não deixem de ler a postagem original, além dos demais textos postatos no site Eleições Hoje.


2 comentários:

Marfim Mosac disse...

Conheço a Edith, já fui em alguns dos encontros que ela organiza todo mês para os jovens homossexuais no Projeto Purpurina, é um projeto bem bacana. A proposta do projeto têm sido trazer os jovens para debater sobre assuntos relacionados a diversidade sexual, além de ajudar aqueles que ainda estão se descobrindo a passar por essa fase tão dificil.

Tô deixando aqui o e-mail de contato do projeto, que fica ali próximo ao Metrô República, no centro de São Paulo.

Contato do projeto: projetopurpurina@gmail.com

Jock Dean disse...

Obrigado pelo contato, meu amor.

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