quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Celebrado primeiro casamento homoafetivo em São Luís

Armando e Ruber beijam-se após serem declarados casados pelo juiz que celebrou a união
Juntos há cinco meses, o casal de empresários Ruber Paulo da Silva Marques e Armando de Souza Filho tornaram-se o primeiro casal gay do Maranhão a celebrarem seu casamento civil após a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que autoriza os cartórios de todo o país a celebrar o casamento civil facilitou a decisão. A cerimônia aconteceu na tarde de ontem, na 7ª Vara da Família, no Fórum Desembargador Sarney Costa, no Calhau, e para o juiz que celebrou o casamento trata-se da vitória da justiça sobre o preconceito.

O casal Ruber e Armando está junto há cinco meses. Eles se viram pela primeira vez durante um espetáculo do Cirque du Soleil. Amigos em comum ajudaram a unir o casal. “Eu morava em São Paulo na época, onde nos conhecemos. Passei um fim de semana em São Luís com Ruber. Cheguei na sexta-feira, na terça-feira voltei para São Paulo e já às 5h do dia seguinte retornei para São Luís de onde não saí mais. Larguei tudo em São Paulo para vir morar com Ruber em São Luís”, disse Armando de Souza Filho Marques.

Já no terceiro mês de relacionamento, a partir da percepção da comunidade sobre seus ideais de vida, projetos e sentimento, decidiram que era o momento de oficializar a relação. “O casamento enquanto ritual simbólico da união sempre foi um ideal comum a nós dois, um sonho antigo. Já o casamento enquanto processo judicial, com todas as suas implicações legais e sociais, tornou-se, sim, uma nova possibilidade dentro dos nossos planos após resolução do CNJ”, afirmou Ruber Marques de Souza.

Cerimônia - E a oficialização da relação aconteceu na tarde de ontem em uma cerimônia rápida que reuniu o casal, alguns amigos, entre eles as testemunhas do casamento, e o juiz Jesus Guanaré de Sousa Borges, titular da 7ª Vara da Família. O casal esteve visivelmente emocionado durante toda a cerimônia, mas disseram que estavam muito felizes por poderem oficializar sua relação. Após um breve discurso o juiz Jesus Guanaré perguntou se eles, por livre e espontânea vontade, aceitavam receberem um ao outro como marido. Com a resposta positiva dos dois ele os declarou oficialmente casados.

Como em toda cerimônia casamento o casal trocou alianças e beijos após o sim e passaram a assinar com os novos nomes de casados: Ruber Marques de Souza e Armando de Souza Filho Marques. “Como Armando é Filho, ele não poderia perder o último sobrenome e eu não poderia adotar o Filho, então cada um passou a usar o último sobrenome do outro”, explicou Ruber de Souza. A festa de casamento aconteceu dia 27 do mês passado para que a família de Armando Marques, que é de Minas Gerais, pudesse participar. A lua de mel do casal, que vai continuar morando em São Luís, também já aconteceu.

O casal acredita que a publicização da cerimônia de casamento será uma forma de educar a sociedade em geral, uma vez que a nova resolução do CNJ não altera ou fere o direito e o dever de nenhum outro cidadão, mas iguala os cidadãos a uma legislação que reza a igualdade de direitos constitucionais. “Acreditamos que a partir de nós outras pessoas também tomarão a decisão de se unirem e mostrarem que sua relação é tão natural quanto as demais”, comentou Armando Marques.

Resolução - A oficialização do casamento civil do casal foi possível porque em maio deste ano o CNJ determinou que os cartórios de todo o Brasil realizassem tanto a conversão da união estável  entre pessoas do mesmo sexo para o casamento civil quanto o casamento diretamente. A resolução foi tomada com base em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu a validade das uniões estáveis homoafetivas, em maio de 2011. Segundo o juiz Jesus Guanaré o casamento de Ruber e Armando representa a vitória da justiça e igualdade sobre o preconceito. “Como juiz de direito o que eu mais gosto é de celebrar casamentos. Unir pessoas pelo amor e pelo afeto é algo que me torna muito feliz”, afirmou.

Mesmo antes da resolução do CNJ, alguns cartórios já realizavam casamentos homoafetivos. Nos estados de São Paulo, Bahia, Piauí, Paraná, Alagoas e Espírito Santo decisões das corregedorias locais permitiam as celebrações. Em outros estados o procedimento dependia de autorização judicial, o que possibilitava que no mesmo estado um juiz de uma cidade autorizasse o casamento gay, enquanto o de outra cidade não, pois as decisões judiciais eram independentes.

Em novembro do ano passado, o casal Gilmar Silva Berredo, 42 anos, e Júlio Pereira da Silva, 38 anos, também celebraram seu casamento civil. A cerimônia ocorreu no Salão do Júri do Fórum de Justiça da cidade de Bacabal, a 240 quilômetros de São Luís. Os dois já moravam juntos há 19 anos, mas tiveram que entrar com uma ação na justiça para terem o direito concedido. Ruber e Armando tornaram-se o primeiro casal a celebrar sua união após a decisão do CNJ. De acordo com a 7ª Vara da Família de São Luís outro casal já deu início aos trâmites para oficializar seu casamento em São Luís, mas a data ainda não foi marcada.

Censo2010 - Segundo o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Maranhão tem 717 casais homossexuais em união estável declarada. Essa foi a primeira vez que a pesquisa incluiu uma amostra referente à relação de casais formados por pessoas do mesmo sexo no país. Segundo o Censo, o número de relacionamentos gays representa 0,06% da população maranhense quando comparado aos 1.195 milhões de casamentos entre heterossexuais no estado. O estado ocupa a 6ª posição entre os da região Nordeste, que possui 12.196 enlaces entre casais LGBTs e o 18º lugar no ranking nacional.

O IBGE baseou sua contagem na auto-declaração durante a coleta de dados para o Censo 2010. No Brasil, dos 37.487.115 milhões de casais, 59.962 (0,16%) são formados por companheiros do mesmo sexo.

Matéria publicada na edição de hoje do jornal O Estado do Maranhão
Foto: Flora Dolores/O Estado

quinta-feira, 20 de junho de 2013

E São Luís foi para as ruas



Manifestantes em frente ao Palácio de La Ravadiére, sede da Prefeitura de São Luís

Assim como está ocorrendo em dezenas de outras cidades brasileiras, os ludovicenses estão insatisfeitos com a precariedade dos serviços públicos prestados. Os ônibus são, pelo menos uma boa parte, sucateados; alguns chegam a ter 20 anos de uso. Os usuários se espremem todos os dias em veículos lotados que demoram até uma hora para passar pelo ponto e o trânsito, sem planejamento, é lento e as grandes avenidas da cidade estão sempre congestionadas.

E este mesmo cidadão que passa uma hora ou mais dentro de um ônibus lotado, às vezes, precisa acordar de madrugada para tentar uma consulta em um posto de saúde onde chega a faltar até remédios. Nas escolas públicas, o filho dele precisa aprender a estudar com poucos recursos e seus professores têm que criar novas técnicas que o mantenha estimulado.

Se esse usuário do transporte público é gay, ele ainda tem que lidar com piadinhas de todo tipo por causa da sua sexualidade e aceitar ser ofendido se um deputado qualquer aprova um projeto de lei que o trata como doente. Se ele é negro, tem que ignorar aquela pessoa que a mandou pegar o elevador de serviço porque é claro que ela só o confundiu com um empregado do prédio.  Se for mulher, tem que aceitar ser chamada de gostosa. É só nossa cultura. E era por tudo isso e muito mais que tudo isso que a maioria, sim, a maioria, das pessoas foram às ruas ontem.

Atos de vandalismo não são evitáveis, infelizmente, afinal é muito fácil se esconder em meio a uma multidão de 10 mil pessoas, segundo a PMMA, que em sua maioria estava ali lutando por políticas públicas de qualidade para todos de forma pacífica, sem qualquer intenção de promover violência. Ali estavam muitos que há anos vem lutando por serviços públicos de qualidade, por respeito, direitos e dignidade para negros, mulheres, indígenas, LGBTs, pessoas com deficiências, moradores das periferias...

Eu sou contra a destruição cometida com o prédio da Prefeitura de São Luís, um edifício tombado pela Unesco como Patrimônio da Humanidade e com 400 anos de história, por isso espero que todos os vândalos sejam punidos, assim como aqueles que, quem sabe, os orientaram a tal.

Mas não são nos vândalos que temos que nos concentrar, mas no ideal do movimento que é o de mudança. Houve falhas? Sim. Muita gente estava lá sem nem saber pelo que lutava? Sim. Havia quem pedia melhorias nos serviços municipais em frente à sede do governo estadual e quem queria mudanças na política estadual protestando na porta da Prefeitura. Erros à parte precisamos começar de alguma forma e ir aprendendo a nos mobilizar, a exigir direitos e políticas públicas justas e igualitárias.

E se as pessoas insistem em bandeiras antigas, as causas de sempre, de décadas, é porque talvez, apesar do esforço, as mudanças necessárias ainda não aconteceram, por isso a insistência. Portanto, não desmereçamos o movimento, que não é novo. Não começou semana passada em São Paulo, mas está há anos acontecendo pelo país. A diferença é que agora ele grita ainda mais alto.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Cada um tem seu quadrado

Em um mundo onde cada vez mais as pessoas buscam seu espaço, expressar sua opinião e serem respeitadas como são, na sua individualidade e diversidade, parece que está ficando cada vez mais difícil respeitar o princípio físico segundo o qual dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo.

Há quem diga ser contra o casamento gay porque isso irá destruir a família. Eu, por motivos mais que óbvios, sou totalmente a favor do casamento civil homoafetivo, que agora pode ser celebrado tranquilamente em todo o território brasileiro e outros 15 países do mundo. No entanto, ser contra as relações homossexuais, seja por qualquer que seja a convicção, não anula o fato de que LGBTs estamos aí querendo ser reconhecidos como cidadãos plenos. Nós casamos, temos filhos (adotivos ou biológicos), dividimos a conta do supermercado, da creche, de luz, internet, TV à cabo... Então porque não teríamos o direito de oficializar isso em um cartório?

Vejam bem, o fato de gays poderem casar não significa nada além disso. Ninguém está obrigado a se casar com um homossexual. Quem é contra a homossexualidade tem resguardado o seu direito de não se casar com um. Se você não gosta de gays não os convide para jantar na sua casa, para a festa de aniversário do seu filho... Simples, não é?

E os ateus, esses pobres infelizes que cometeram o erro de não crerem em deus, qualquer que seja a sua representação nas milhares de religiões existentes? Como alguém pode não acreditar em deus? Que sentido tem uma vida sem ele? Como ser feliz, completo, realizado, prosperar, acordar todas as manhãs, pegar um ônibus lotado e enfrentar um engarrafamento daqueles sem ter deus no coração me dando forças?

Bem, eu faço isso todos os dias exatamente da mesma forma que os demais passageiros que, em sua maioria, devem acreditar em deus. Talvez eles estejam conformados com o fato de que deus quis que suas vidas fossem assim. Talvez eles sintam algum conforto, pois sabem que deus tem um plano para eles e esses dias de ônibus lotado passarão. Talvez eu me sinta mal porque não é nada confortável ficar uma hora em pé em um ônibus cheio. Talvez... O fato é que, existindo ou não, eu simplesmente não sinto a necessidade de orar todas as manhãs. Simples assim. Por que eu preciso crer em um deus?

Há espaço para todo mundo no mundo. Basta que respeitemos o fato que nem todo mundo é como nós. Talvez seja mais fácil conviver com pessoas que são iguais ou muito parecidas conosco. Quem não quer alguém para conservar sobre deus, o último episódio da nossa série preferida, a nova tendência de moda que inclui calças com estampas de aves exóticas? Lutar contra o fato do outro pensar diferente é tão eficaz quanto tratar doenças com pílula de farinha e não venham me falar aqui do efeito placebo, ok?

Faz sentido terminar uma amizade porque seu amigo prefere sorvete de pistache a chocolate? Tem razão quem termina um casamento porque o cônjuge não assiste aos filmes do Almodóvar? Qual o benefício de declarar uma guerra contra uma pessoa que come todos os dias no Bobs só porque você está de dieta? Pessoas têm necessidades diferentes, de acordo com suas peculiaridades, que são muitas. Se sou eu quem está de dieta que diferença faz para mim se todos os meus comem chocolate? Há espaço para todos desde que aprendamos mais a viver em vez de apenas conviver.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

17 de maio

Faz tempo que não passo por aqui. Muito por causa da minha falta de tempo, mas, sobretudo pela falta de inspiração para escrever. Sou desses bobos que acham que um texto só vale quando tem paixão, quando sangra, quando está vivo. Enfim, não acho que tenha conseguido isto hoje, mas vamos ao que interessa.

 
Primeiro uma boa notícia. Notícia essa que eu realmente não pensei que teria anos de vida suficiente para ler em um Brasil cada vez mais assombrado pelo fantasma do fundamentalismo e fideísmo religioso. Sim, pintosas e caminhoneiras, agora podemos chegar em um cartório acompanhadxs do boy ou da gata e celebrar nosso casamento civil. Ponto para o Brasil e para o CNJ.

 
Agora o motivo dessas mal traçadas linhas. Hoje, 17 de maio, é Dia Mundial de Combate a Homofobia. A data foi escolhida porque foi nesse dia que a Homossexualidade foi excluída da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID) da Organização Mundial da Saúde (OMS) em 17 de maio de 1990, oficialmente declarada em 1992. Por todo o mundo, marchas, beijaços, seminários e uma série de outras atividades são realizadas para conscientizar a todos que a homossexualidade é tão natural quanto respirar.

Ontem, enquanto eu caminhava do trabalho até a academia fui chamado de viado, como acontece, aliás, na maioria dos meus dias e por mais que tentem me empurrar goela abaixo que isso é bobagem eu não acho que tenho que achar que tudo bem um cara me chamar de viado, é normal, esse tipo de ~brincadeira~ sempre existiu e não adianta querer mudar. Pode até não adiantar querer mudar e pode até ser que nunca mude, mas eu não aceito. Apenas.Eu adoro e me orgulho de ser viado. Não me conheci de outra forma, mas não escolhi sê-lo. Acredito até que se fosse mesmo uma questão simples de escolha haveria poucos viados e sapatões no mundo, afinal quem gosta de ser tratado como inferior, doente, aberração, pecador ou seja lá qual for o demérito?

E dentre os direitos que já conquistamos e as muitas lutas que temos pela frente, acredito que ainda há um longo caminho a ser trilhado. Por aqui seguimos nós lutando pelo nosso direito de nutrir afeto independente do que haja entre as penas ou do que se faça com eles. Independente até de para quantas pessoas direcionamos nosso afeto ou atração sexual.

Apesar de ser um romântico incurável, cada dia mais de convenço que não precisa ser a dois para ser certo, para ser legitimado. Embora não me imagine vivendo um poliamor por que estas pessoas não podem ter reconhecida a validade dessa família ainda mais diferente?

Sei que defender o que os fundamentalistas chamariam de “normalidade de Sodoma e Gomorra” beira ao absurdo, afinal, se já é difícil ~aceitarem~ o casamento entre duas pessoas só porque têm o mesmo sexo, imaginem a guerra que não seria querer que os cartórios celebrassem o casamento de três, quatro ou mais indivíduos na mesma relação? Só me incomoda a padronização, a higienização. Qualquer vivência, desde que saudável, deve ser legitimada, independente de quantas pessoas e quais sentimentos (ou a falta deles) estejam envolvidos.

Enfim, há outras tantas baboseiras que eu poderia dizer. É estratégico colocar todo mundo no mesmo saco, padronizar as necessidade para se conseguir acesso a direitos legítimos, mas não podemos transformar essa padronização em nada além que estratégia de luta. Só acho que diversidade sexual está além dos rótulos hétero, homo e bissexualidade. Como disse, se for saudável e de livre e espontânea vontade, que mal tem? Deve ser ótimo ser santa, mas também não há nada de errado em ser puta.