“Eu tenho vergonha de você!”
A frase é dura, cruel, até, mas é isso que muitos pais dizem aos seus filhos quando ouvem “mãe, pai, eu sou gay!”. Alguns pais não dizem, mas seus gestos a partir daí deixam claro que é esse o seu sentimento quanto filho. Afinal, o que pensaria um adolescente ou qualquer outra pessoa, independente da idade, que depois de fazer tal revelação aos pais ouvisse como pedido um “não conta isso para ninguém”?
Tem ainda a indiferença. O assunto não existe. Entra para o armário no exato momento em que o filho ou filha o sai. Se ficasse apenas nisso, por mais difícil que fosse para o mais novo assumido do pedaço lidar com a situação, pelo menos teríamos alguma possibilidade de esse adolescente crescer e amadurecer sua sexualidade de forma saudável ou, no mínimo, sem muitos traumas.
Minha mãe, depois do “eu tenho vergonha de você” me pediu que não contasse para mais ninguém. Pena que ela foi praticamente a última a saber. Não sei se já superei isso, mas estou aqui, tentando de alguma. Independente de ela ter jogado isso para debaixo do tapete eu tenho buscado viver minha homossexualidade de forma saudável. Claro que aprender sozinho aumenta um pouco o caminho, mas tenho seguido, independente do que ela pensa ou diz sobre meu wallpaper – uma foto da Brit e Madge se beijando no VMA de 2003 – por exemplo.
Enfim, a gente supera, em partes, pelo menos, e segue, mas e quando a coisa vai além disso? E quando os pais decidem “ajudar” seus filhos a voltarem para o “caminho certo”? Quando eles resolvem levar seus filhos à igreja no domingo, por exemplo, e o convite está muito além de uma simples oração? E quando eles resolvem ainda levar aquele menino ou menina de 15, 16, 17 anos ao psicólogo para “resolverem o problema”? Sendo que o problema é um jovem, seu filho, com a personalidade em formação, cheio de medos e dúvidas.
E quando estes pais entendem que o filho, que horas antes estava, por vezes aos prantos, dizendo-lhe “sou gay”, está doente mental, espiritual e psicologicamente e submetem-no às piores atrocidades? E quando o resto da família, os irmãos, por exemplo, que poderiam ajudá-lo a passar por esse momento de uma forma menos traumática, compartilham do pensamento dos pais e dizem coisas do tipo “mãe, ele é insensível, só pensa nele”, “desde que você contou aquilo eu não consigo mais dormir, eu não sinto mais alegria em nada”?
E quando, sob a desculpa de estar ajudando seu filho, os pais, na verdade, fazem chantagem emocional, pior, terror psicológico, e acabam fazendo desse momento de descobertas do filho, um tempo de angústias, desespero, culpas, fazendo esse jovem se sentir o pivô da infelicidade familiar e até mesmo negando a si, a quem é de verdade?
De fato pais, irmãos, parentes assim devem sentir vergonha ou deveriam, pelo menos, mas não do pequeno que quer apenas um abraço, nada muito além, que lhe comunique “eu estou aqui para cuidar e proteger você”. Eles deveriam sentir vergonha de si. Vergonha de conseguirem encarar-se no espelho todas as manhãs ou de deitarem a cabeça no travesseiro todas as noites e conseguirem dormir tranqüilos achando que estão fazendo o certo.
É certo aterrorizar uma pessoa, um filho, por puro preconceito? Não me venham falar em desinformação ou que não sabem com agir. Conheço pais que também não sabiam e ainda assim não submeteram seus filhos a situações desumanas, porque sim, obrigar uma criança a participar de cultos ou terapias para “cura” da homossexualidade é desumano, senhores pais e mães. É tão desumano quanto expulsá-los de casa deixando-os à sua própria sorte.
Eu também tenho vergonha, mas de pais como vocês, de parentes como vocês. Vocês também deveriam sentir vergonha de si.
2 comentários:
Amo o que falas, e concordo plenamente!
Muito bom o texto
Outra vergonha: O pai super liberal, que apoia a causa gay e cresce ensinando o filho que discriminação é errado - mas quando o mesmo conta que é homossexual, ser gay se torna a coisa mais repugnante do mundo.
Conheço uns casos assim, é triste isso de 'Ser gay é legal, contanto que seja da porta da minha casa pra fora.'
Continue assim, ADORO seus textos!
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