“Ninguém é igual a ninguém. Todo o ser humano é um estranho ímpar.”
(Carlos Drummond de Andrade)
Hoje, quando estava na parada esperando um ônibus para voltar para casa, encontrei com uma das minhas professoras da 6ª série. Começamos a conversar, ela quis saber como estava minha vida, se eu tinha seguido os estudos, se estava trabalhando, essas coisas. Contei a ela que estou terminando o curso de jornalismo e que já trabalhava como repórter há mais de um ano, enfim, a coloquei a par de tudo.
Como moramos em bairros próximos, pegamos o mesmo ônibus e o papo continuou até que veio o seguinte diálogo:
Ela: - Então, Jock, já casou?
Eu: - Não!
Ela: - Mas tá namorando?
Eu: - Não!
Ela: - Ah, mas que rapaz é esse que não tem namorada? É só falta de tempo?
Eu: - Também.
Ela: - E o que mais?
Eu: - Eu não tenho namorada por que eu prefiro namorado.
Depois disso houve um longo silêncio da parte dela - que ficou sem saber como agir. Até que voltamos a falar. Falar sobre amenidades.
Baseado nessa conversa de hoje quero fazer-lhes uma pergunta? Por que as pessoas partem do pressuposto que TODOS somos heterossexuais? Por que é tão difícil para as pessoas conceberem a possibilidade do diferente? Seria medo ou insegurança de, ao admitir as diferenças dos outros, ter que se ver como diferente também, afinal, tudo é uma questão de ponto de vista?
Essa dificuldade existe por que temos a necessidade de termos padrões para tudo querendo que todos sejam ou se comportem como ele e nem sempre somos suficientemente flexíveis para dar espaço ao outro para ser como ele quer. Um erro tremendo que só conduz a ressentimentos. Mas isso teria solução se as pessoas meditassem como seria se a situação fosse inversa.
É difícil aceitar as diferenças de outras pessoas porque também não reconhecemos nem aceitamos as nossas. Quando isso acontece aprendemos a aceitar e respeitar as diferenças dos outros também. Há que viver e deixar os outros viverem. O limite de cada um é a liberdade do outro e quando todos pensassem assim tudo seria mais fácil e as relações interpessoais seriam muito melhor.
Esse processo faz parte da vida de todo gay. Primeiro nos percebemos diferentes e depois percebemos que todos os outros também nos vêem como diferentes, inadequados e errados por nossa “escolha”. Assim a única opção é esconder essa grave diferença de qualquer pessoa.
Depois de um longo período de auto-aceitação, não sem alguns (muitos) traumas, aprendemos a lidar com essa questão, mas sempre fica um receio com relação à reação do outros. Senti esse receio ontem quando fui perguntado por que não tinha namorada. Nos segundos que precederam a minha resposta pensei se deveria ou falar o rela motivo. Não por que eu não me sinta seguro de mim com relação a ser gay, mas por que sempre há o medo da agressão, da reprovação, da discriminação.
Ao ouvir minha resposta ela preferiu não comentar. Mudou de assunto. É assim que acontece quando esbarramos com as diferenças alheias. Fingimos que não existem. É mais fácil. Afinal, é mais fácil conviver com a parte das pessoas que me interessa e que eu possa me identificar.
4 comentários:
Além do absurdo de se pressupor que td mundo tem que ser hétero o que mais me irrita nessas situações são os silêncios. Como sempre, vamos jogar para debaixo do tapete e fingir que não ouviu. Quem sabe assim, não desaparece da minha visão e funde-se ao cenário?
É ainda falta um bocado pra q as pessoas aceitem, compreendam e convivam bem com as diferenças.
Lilah, sempre fico irritado com isso também: com a pressuposição e com o silêncio. Mas o que me irrita mais são aquelas pessoas que, após ouvirem que tu é gay, fazem perguntas do tipo "desde quando?". Como se houvesse a possibilidade da pessoa escolher essas coisas. ¬¬
Fábio,as pessoas NÃO sabem conviver com as diferenças porque elas não concebem essa possibilidade. Vivemos na era do PADRÃO mais do que nunca. Até mesmo "os diferentes" tem essa dificuldade.
Obrigado pela vista e volte mais vezes para trocarmos idéias. Abraços,
Eu acho que quanto mais a pessoa é diferente mais ela aceita a diferenças dos outros, eu pelo menos sou assim!
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