Uns versos

Enquanto espero, escrevo uns versos, depois rasgo.
(Adriana Calcanhotto)

Sexto sentido. Dizem que existe. Algumas pessoas juram que tem. Eu fico em cima do muro quanto a isso, mas ontem, se é que existe e eu tenho sexto sentido, eu deveria tê-lo seguido. Era para ser apenas uma saída de amigos, algumas cervejas e um papo displicente. De alguma forma eu senti que seria bem mais que isso e que eu não voltaria para casa tão animado quanto saí. E foi exatamente isso que aconteceu.

Um local novo para mim, agradável, música boa, gente divertida, cerveja gelada. A noite foi seguindo e o papo tomando novos rumos até que eu sumi. Não, não havia ido embora. Estava lá, ainda, sentando à mesa, prestando atenção desesperadamente às letras das canções que embalavam as conversas alheias para não ouvir e ver o que se passava ao meu redor, mas especificamente na minha mesa. Eu ainda estava sentado lá e assim fiquei até o fim da noite, mas era como se não estivesse, de repente fiquei invisível.

A noite que prometia ser agradável e cheia de boas lembranças transformou-se em sofrimento. Das lembranças ficaram as lágrimas derramadas, os socos trocados, a raiva exteriorizada, o desapontamento, um pedaço de papel com três pedidos de músicas anotados guardados no bolso detrás da calça e uns versos desesperadamente repetidos como mantras para não deixar aflorar os sentimentos de vez.
Dentre esses versos estão:


“Às vezes fujo pro meu pedestal, faço tudo prá não cair, mas quando desço, eu desço tão mal de que me adianta fugir?”

“O mais caro me negavas que era todo o teu amor.”

“Tu me ofendes, tu serás o ofendido, pois quem com o ferro fere com ferro será ferido.”

“Hoje eu quero a rosa mais linda que houver, quero a primeira estrela que vier para enfeitar a noite do meu bem.”

“Andei sozinha, cheia de mágoas, pelas estradas de caminhos sem fim. Tão sem ninguém que pensei até em morrer, em morrer.”

“Ah! Se eu tivesse quem bem me quisesse esse alguém me diria: ‘desiste, essa busca é inútil’. Eu não desistia.”

“Eu que não sei quase nada do mar descobri que não sei nada de mim.”

“Você verá que é mesmo assim, que a história não tem fim, continua sempre que você responde sim à sua imaginação. A arte de sorrir cada vez que o mundo diz não.”

“Dorme, menino grande que eu estou perto de ti. Sonha o que bem quiseres que eu não sairei daqui.”
Há outros, muitos outros, mas esses me marcaram mais. Para descrever como me sinto hoje após a noite de ontem deixo-lhes alguns versos da Marina Lima que não fizeram parte da set list de ontem, mas que são perfeitos para me descrever.

Estou assim – Marina Lima

Estou assim
Como o mar que não chega na areia

Estou assim

Com esse sangue estancado na veia

Até você me ligar

Estou assim

Como um mês que não passa do meio

Tão assim

Esperando esse amor que já veio

Até você se tocar

Fivelas, cremes, incensos

São tantos produtos

Tantas preocupações

E esses labirintos do meu coração
Mas eu sei que quero, amor

E o que você disser será aceito

Estou assim

Um talento por pouco perdido

Quase assim

Como um som que não quer ser ouvido

Até você me amar

Estou assim

Com esse cisco caído no olho

Tão assim

Uma lata vazia de molho

Até você me cansar

Cigarros, aspirinas, restos de perfume no frasco

Tantas saudades

Tantas indagações

Nesses labirintos do meu coração
Mas eu sei que quero amor

E o que você disser será aceito